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sábado, 4 de maio de 2013

Crônica ---------------------------- LALAUZINHO DA PORRA! ................................................. (Costa Filho*)


                                                      *Membro da Academia bacabalense de Letras

Era noite na Vila Kühn. Seu Joca achou de lavar o carro à porta de casa. Lavou. Guardou. Mas com os apetrechos de lavagem na calçada, aproveitou para retirar uns matinhos do meio-fio e limpar o asfalto. Um carinha franzino, sujo, feinho e supostamente drogado, morador de perto, chega por ali com um copo na mão. Chegou encarnando popularidade:
Tô armado não – foi dizendo.
Pediu “dois real”. Não tinha. Pediu um conto. Não tinha. 50 centavos, pelo menos. Não tinha mesmo, estava liso.
Mas o traste do feinho não desistia:
− Pô, me dê só cinquenta. O senhor tem, eu sei.
− Não tenho, jovem, já disse – falou seu Joca incisivo.
− Eu lembro do Senhor no dia que me deu “dois real” lá no caipirinha. O Senhor é legal.
− Sim, obrigado, mas hoje estou liso, já te falei.
− Pois me dê “25 centavo” nesse copo pra mim inteirar uma dose ali...
− O quê? Nunca! Não faço esse tipo de negócio.
− Então posso ficar com essa escova?
Seu Joca fitou o olhar no feinho homem.
− Meu amigo, por que eu te daria esta escova? E com quê eu lavo o carro, a calçada?
− Pois pronto, eu ajudo a limpar aqui tudo e o senhor me dá “dois real” pelo serviço – e já foi logo pegando a mangueira e a pazinha.
− Mas que serviço, Feinho? Não vê que já terminei? – disse seu Joca, puxando o balde mais para si.
O carinha sentou-se, calou um pouco, balançou a cabeça, assungou as calças no corpo esquelético e, olhando no pescoço de seu Joca, propõe:
− E esse cordão, vamos fazer um rolo nele?
− Este colar é bijuteria, é do meu uso e não vou fazer negócio nenhum com ele, nem com nada.
− Mas...
Outra vez seu Joca se enche do maluco:
− Vem cá, rapaz, por que tu ficas nessa vida de pedinte aborrecendo a um e a outro? Me diz?
− Sei não, sô, mas se me der essa mangueira, eu sumo daqui – mostrou o objeto estirado no asfalto.
Evitando explodir de vez, seu Joca quis resolver o dilema de modo tranquilo, afinal, Feinho era seu vizinho e estava tomado, tinha forte inhaca de pinga e, de certo modo, lhe mantinha a consideração como homem de bem e sabido. Disse-lhe então que ia ver se achava algum dinheiro para que ele o deixasse em paz. E adentrou o portão com receio, deixando apenas uma pequena fresta.
No retorno foi dizendo que não achara dinheiro, mas nem completou a fala, já foi vendo o carinha se peneirando para correr, enquanto da ponta da língua lhe saía a descarada frase:
− Pois vou levar esse balde pra mim.
E seguiu o Feinho pelo escuro da Vila a fazer do balde e da escova seu tambor de festa.
Ao seu Joca restou abortar a carreira, ver o sujeito sumir no baixo escuro e descarregar entre o ódio e a pena:
− Lalauzinho da porra! Vai-te com isso tomar ao menos um banho!
De resto ficou-lhe ainda uma inacreditável dúvida: será que aquele casal que empurrava uma bicicleta já ia levando aquele mesmo balde?