Bacabal do
Maranhão. Sábado, 19 de julho de 1958. A singela pracinha de Santa Teresinha,
hoje chamada Praça Silva Neto, bem no centro do antigo e bem falado Bacabal de
outrora, acolhe uma aglomeração de pessoas, que disputam espaço entre os
tabuleiros de tecidos, confecções e eletrodomésticos. A casa é alta e a
fachada, de cor creme, ainda fresca, impregna os traços de uma usina de arroz.
As paredes elevadas e fornidas de adobe, o reboco forte e a tinta nova, dão ao
prédio um aspecto renovado e imponente perante outras casas comerciais da
cidade. As portas, largas, se agigantam para cima, assim como as paredes, com
suas beiradas e detalhes brancos em alto relevo a subir rumo ao céu, e lá em
cima, ao centro, o desenho de uma estrela, numa profecia simbólica de que ali
nascia uma estrela mercantil nos céus da nossa querida Bacabal. Daí ganharia
depois outras dimensões.
1ª Loja do Armazém Paraíba, Bacabal, 1958 |
Tinha uns
sessenta dias atrás que aquelas portas eram apenas um dos três galpões da Usina
Dois Irmãos, alugado que fora para fins logísticos de ofertar ao Vale do Mearim
o que os homens da cidade e as donas de casa precisavam, como fazendas e
máquinas de costura, “roupas feitas”, cadeiras de macarrão, bicicletas,
colchões, entre outros produtos bem característicos dum tempo em que nossa
Bacabal alçava voo nos “Anos dourados” dos fins dos anos 50.
Agora estava sendo inaugurada na cidade uma
nova opção de empório, o Armazém Paraíba, cuja inscrição na parede era uma
clara referência às origens de saída e determinação dos seus proprietários para
cá, ao Mearim. Chegaram. Estabeleceram-se. E o momento era muito diferenciado
dos demais comércios e dos tempos da época. O ambiente era alegre, festivo,
memorável, bom de comprar e animado para se ver. Desde cedo do dia, o moleque Nilo Lago já
acordara com os estouros dos foguetes. O dia ia ser bom, pois ia ter até
corrida de bicicletas do Paraíba até o Ramal, com premiação e tudo mais. Cá
fora as paredes da loja se enfeitavam com “cortes” de chita, e lá dentro, no
lugar do forro, panos coloridos decoravam o teto largo e fundo do barracão. A
ordem para abrir foi dada pelo Seu Joca. Foi o vendedor e propagandista João da
Costa Ramos quem abriu. E o fez com muita emoção. O povo entrou. Estava
inaugurado o primeiro Armazém Paraíba da história.
Embrenhados
na festa, o povo sorria, comprava, bebia e jogava conversa fora e já não
queriam ir-se. Os clientes, autoridades e curiosos se sentiam altamente felizes
e privilegiados em estar participando da inauguração daquele que, pelo jeito
seria o armazém mais popular da cidade. No terreiro, uma camionete de
carroceria de madeira e um megafone sobre a cabine anunciava o rasga-rasga de
preços baixos, vendas no fiado e produtos da melhor qualidade. Enquanto isso, a
pracinha, no inverno alagada, era uma festa só. Gente indo, gente vindo, os
homens com suas calças simples e sociais, as mulheres com suas saias longas e
fartas, e as crianças vestidinhas de babado ou calçõezinhos curtos. Os homens
da roça, alguns com sua senhora a passar a pé ou de bicicleta, e, enxergando
pela aba do chapéu, amarram seus animais e entram no empório para ver o que ali
se sucede. Moços novos e até moleques encostam sua Monark ou sua Caloi
enlameada das paragens e da própria praça sem calçamento, e todos se somam na
multidão. O povo é uma curiosidade só, mas já parece afeito à proposta do
armazém e seus donos, que ainda desconhecidos da população, se misturam ao povo
cheios de carisma e simplicidade. A notícia correra, mas nem a todos alcançou. O
fato começa a ser o motivo das conversas nos pés de balcões, à beira do rio, no
carregamento de cargas, nas conversas urbanas e rurais e nos caminhos a fora.
Bem perto da Rianil, uns “cumpades” cogitam de quem seria o empreendimento; e,
ali vizinho, na porta da Souza Cruz e também em frente ao Dr. De Paula, o
assunto era o mesmo. Mas quem seria esse comerciante novo que chegou com aquilo
tudo? Havia de ter muito dinheiro e coragem. Havia de ter também uma estrela
para o negócio. Isso era o que podiam se perguntar os comerciantes das lojas
tradicionais. A conversa tanto girou que chegou a um funcionário, o qual
assegurou sobre os donos, mostrando entre o povo, os irmãos Valdecy e João
Claudino, protagonistas mentores daquele marcante evento. Um deles, o Seu Joca,
já se punha perto do megafone para, ele mesmo dar sua colaboração na propaganda
inaugural da loja. Ele era assim? Sempre presente, simples e contribuidor? Sim,
isso mesmo, teria sido a resposta.
O povo veio,
gostou, comprou e foi-se feliz para a sua família contar as boas-novas. Quanto
à cidade, essa abraçou com afeto os novos comerciantes vindos de Cajazeiras
fazer vida aqui no Mearim. Vieram. Acharam graça em nossa terra e nossa terra
neles. Aqui fincaram a pedra fundamental de um grande empreendimento que se
consolidaria futuramente passo a passo num grande negócio, com muito trabalho e
determinação. O sonho estava se realizando. E muito bem.
Terminada a
festa, uma câmera fotográfica eternizou o feito numa foto simples, mas
significativa, uma prova rara do momento que seria a inspiração de muitas
histórias e combustível para muitas outras lutas e vitórias dos irmãos
Claudino, a partir de um singelo armazém fundado em Bacabal, mas denominado
Paraíba.
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(Costa Filho, da Academia Bacabalense de Letras, Cadeira 2)