Prédio da Escola de Música de Bacabal com a afachada antiga |
UMA CRÔNICA A PROPÓSITO DO NOVO NOME DA ESCOLA DE MÚSICA DE BACABAL
por Costa Filho, artista da terra.
Na sessão da câmara de 03/04/2013, às
portas das comemorações dos 93 anos de Bacabal, foi aprovado por unanimidade o
projeto que muda o nome da escola de música do município, de “Francisco Padilha”
para “Almir Garcês Assaí”.
Em apoio ao movimento, referendado no
maestro Víctor Emanuel e abraçado pela SEMUC, na pessoa do secretário José
Clécio Silva, estavam integrantes da Banda Santa Cecília, artistas e populares
a lotar a pequena cabine destinada ao povo.
A aprovação, anunciada, e apresentada
que fora pela presidenta da Casa Regilda Santos foi comemorada com a
tradicional sinfonia “parabéns a você”. Por sua vez, a imprensa, sempre junto e
a serviço da notícia local, lá estava com seus holofotes a registrar o
histórico momento de realização para uns e falácia de outros, em declarações
que, embora de bocas diferentes, canalizavam-se a uma mesma satisfação: a justa
homenagem concedida a Almir Garcês Assaí, nosso mais nobre e tradicional nome
da música bacabalense.
De fato, a homenagem foi mais do que
justa, valendo dizer, foi atrasadamente justa, a tirar pelos depoimentos de
“realização” e “alma lavada” dos artistas musicais, e da fala dos nossos edis o
“merecido reconhecimento”, sobretudo nesse período inicial de governo em que a
aceitação popular se faz elemento fundamental e num momento de ânimos
inflamados de nativismo e sentimento natalício acalorado pelo aniversário da
cidade.
Vale lembrar que fato semelhante ocorreu
com o “seu Assaí” em 2001, quando em sua fundação a Academia Bacabalense de
Letras escolheu de modo também unânime o nome do nosso músico e cartorário como
patrono da cadeira nº 7 em caráter vitalício, por considerá-lo uma figura das
mais nobres e dignas de reconhecimento nos anais da história de nossa artística
Bacabal.
Afora, porém, o mérito associado àqueles
que de algum modo contribuíram para essa louvação, este fato-homenagem não soa apenas
pela sua relevância cultural, mas ecoa para reflexões mais profundas no cenário
político-social bacabalense. Falo da real valorização dos nossos talentos; falo
das homenagens arbitrárias ou meramente egopolíticas de órgãos ou logradouros
públicos como escolas, praças, ruas, estádios, etc.; falo da postura de alguns
dos nossos edis quando da aprovação de projetos na egrégia câmara municipal.
Ora, veja, é por demais conhecida entre
nós a máxima de que “Bacabal é um celeiro de artistas”, mas nesse entrar e sair
de governos a nossa história, sobretudo nas últimas gestões, apenas continuou
sua caminhada para o esquecimento, numa negligência jamais vista. Os “artistas da terra”, ainda que talentosos,
parecem mesmo não ter ainda nenhum respaldo de público e aceitação popular
diante de qualquer oferta vinda de fora. Quem já houve de escutar algum clamor
público por shows ou apresentações de
artistas locais? Vendo por esses dias uns comentários em blogues da cidade sobre
a programação de aniversário de Bacabal, fiquei um tanto pasmo com a
preferência forasteira, cara e de qualidade duvidosa requerida por muitos de nossos
internautas e não lembro ter visto algum enfocando a cultura local.
É, parece que realmente, sobretudo entre
nós, “santo de casa não faz milagres”, mas deveria fazê-lo, se a própria
câmara, em sintonia com o executivo, começassem a olhar, propor e assistir com
carinho e orgulho o talento do povo, que a eles creditou confiança, afinal, a
cultura é uma demanda política que requer a implementação de políticas públicas
em todo o setor.
Enquanto não se fizer pelo nosso ordeiro
povo; enquanto desse mesmo povo se tiver vergonha de sua cultura, e o pior,
enquanto se achar a cultura “importante” apenas nas falácias de ocasião, e,
enquanto não se descer as escadarias da periferia desse povo, apoiando-o em sua
aptidão e sonhos, nunca teremos público no nosso palco ou nunca riremos do
texto teatral de Dalva Santos, ainda que se intitule “Pão com ovo e carne”.
Também nunca haveremos de comprar os CDs de Perboire Ribeiro, Deyse Caroline,
Marcos Maranhão e conhecer o estilo de Johnny Rock Blues, o “Raul Seixas”
bacabalense; nunca interpretaremos o enredo de “Zuíla louca”, de Costa Filho,
nem recitaremos a poesia de Casanova e as louvações de Raimundo Sérgio; nunca
assistiremos a um sarau literário ou uma exposição das artes plásticas do
Roberto Lago; nunca enfeitaremos a nossa casa com uma peça do artesão Urquiza
ou Ejoão Martins; nunca dançaremos o compasso do Bumba-Boi Vencedor. E, para
lembrar o nosso personagem em pauta, nunca cantaremos a composição de algum
docente ou discente da Escola de Música Almir Garcês Assaí.
Para o nosso povo prosperar cultural e
historicamente com mais brilho e evolução, necessário se faz que os poderes executivo
e legislativo e irmanem, substanciando a cultura com ação e apoio permanentes,
usando também o paletó cultural, o discurso da ação e a caneta do compromisso
com as nossas artes, já que uma cidade em suas manifestações culturais releva a
face dos que a governam.
Outro fato a que se refere esta crônica
é a postura de alguns dos nossos edis, que, sendo representantes do povo,
muitas vezes contraria a vontade desse mesmo povo, que nunca é consultado, nem
dispõe duma “tribuna popular”. O que às vezes se pensa é que alguns ali estão
apenas para aprovar leis do executivo, sem por vezes questioná-las em função da
lógica da conveniência política. E foi isso que aconteceu em pleito passado
quando o nome do então Secretário de Estado da Cultura Francisco Padilha foi
indicado para nomear a nascente Escola de Música. Não que ele não tivesse seus
méritos na instalação da escola musical, mas será que o mesmo fazia disso tanta
questão? E apoiar uma cultura nos municípios não estaria no bojo de seus
deveres? Pelo sim, pelo não, ele foi eleito, à revelia da consulta popular e em
detrimento do questionamento em favor do músico, escrivão e cidadão bacabalense
Garcês Assaí. Note-se que na então época já atuavam na Casa Legislativa alguns
dos que hoje a compõem, mas na época não viram em Assaí a grande relevância
cultural delegada de modo unânime na recente sessão do dia 3 de abril. E por
que Assaí não fora indicado na época pelos mesmos vereadores que agora o
reconheceram como “homenageado merecido”? Pura conveniência política que renega
seus filhos mais tradicionais e que, ao contrário disso, deveriam ser
defendidos e valorizados.
Tal reflexão alcança ainda o fato de os
prédios ou logradouros públicos estarem à mercê da troca de seus nomes ou
batizados por nomes que nada tem a ver com a área, mas pelo simples fato de ser
um político ou parente dele. Ora, defendo, e não são poucos os que comigo
concordam, que uma homenagem pública tramite pelo princípio do reconhecimento justo e comprovado e não pelo critério do marketing político e da lisonja. Assim sendo não há sentido
justo ou democrático, por exemplo, nomear uma escola ou creche com o nome de
alguém que não tenha deixado seu legado como professor, assim como nomear uma
casa de saúde em favor de alguém que não um médico, enfermeiro ou similar, ou
ainda dar nome de quem nunca foi atleta a uma arena esportiva.
Infelizmente tais práticas têm se
tornado corriqueiras nas câmaras e bancadas políticas, não havendo ruas,
escolas, pontes, praças, hospitais e até cidades inteiras que escapem das
artimanhas egopolíticas de louvação a governadores, prefeitos, senadores,
presidentes, padrinhos políticos e tantas outros títulos que terminam
menosprezando os verdadeiros heróis do povo.
Esperamos que isso sirva de reflexão aos
nossos representantes, posto que o povo não comunga, e de algum modo está atento
a essas práticas abusivas e muitas vezes dissimuladas.
Por fim, que possamos, povo e governo,
legisladores e artistas cantarmos juntos a canção do progresso
histórico-cultural de nossa cidade, irmanando-se nesse processo de valorização
e reconhecimento dos filhos de bacabal através dessa nova gestão que tem
sinalizado seus ares de boa vontade em alavancar nossa cultura.
Resta-nos, como fez o próprio Garcês
Assaí, seguir o caminho da canção, assentando no livro de nossa história a
esperança de um dia ocupar o nosso devido lugar nessa terra de artistas.